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Editado por Harlequin Ibérica.

Uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2015 Harlequin Ibérica, uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

N.º 7 - Julho 2015

 

© 2011 Penny Jordan

Um grande plano

Título original: The Most Coveted Prize

 

© 2011 Penny Jordan

Luta pelo poder

Título original: The Power of Vasilii

Publicados originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial.

Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Sabrina e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença.

As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Dreamstime.com.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-7178-6

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño, S. L.

Sumário

 

Página de título

Créditos

Sumário

Um grande plano

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Capítulo 12

Epílogo

Luta pelo poder

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Capítulo 12

Epílogo

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Um grande plano

Capítulo 1

 

Alena soube que o queria, de forma um pouco desesperada, assim que o viu. Aconteceu no átrio de um hotel de Londres no início da semana. A explosão feroz do até então desconhecido e inesperado desejo físico, atingindo-a tão poderosamente que quase chegou a sentir dor… E que a deixou, sem qualquer margem de dúvida, esclarecida quanto ao seu significado, deixando-a trémula da cabeça aos pés e em chamas pela força do seu próprio desejo.

Presumira então que aquele homem representava tudo aquilo para o qual o seu meio-irmão mais velho, Vasilii, a tinha alertado constantemente a respeito do sexo masculino. Ele era perigoso, ela sabia-o… Qualquer uma o saberia, embora Vasilii a tratasse como se ainda fosse uma menina e não uma mulher.

Alena suspirou. Amava genuinamente Vasilii, embora fosse o irmão mais terrivelmente antiquado, moralista e protetor que alguém poderia ter. De qualquer forma, havia algo a respeito dele que a atraíra e a enfeitiçara além da razão, e além de qualquer coisa que conhecesse ou esperasse conhecer. Será que tinha sido atingida pelo amor? Ou seria o seu ardente sangue russo o responsável? Ou talvez tivesse alguma vulnerabilidade a homens russos perigosos que tivesse herdado da sua mãe inglesa, que se apaixonara tão rapidamente pelo seu pai russo?

Não importava. O que estava a acontecer-lhe superava a capacidade de análise dos professores da sua escola muito rigorosa. Nada importava, a não ser aquele desejo crescente que agora a dominava. O ar de pura sexualidade dele e a necessidade que sentia de se entregar àquilo, de ser consumida pelo desejo, enchia os seus sentidos, não deixando espaço para mais nada. Só a ideia de respirar o mesmo ar que ele era suficiente para a deixar aturdida de prazer e fazer o seu corpo reagir sensualmente como se ele lhe tocasse, a acariciasse, ensinando-lhe todos os significados de ser mulher.

Alena estremeceu num reconhecimento mudo do domínio dele sobre as suas reações. A qualquer momento, virar-se-ia e vê-la-ia, e, então, reconheceria o efeito que tinha sobre ela. O seu coração deu um salto de expetativa e apreensão. Ah, sim, ele era perigoso… E ela desejava-o, ansiava por isso.

Podia ter apenas dezanove anos, como Vasilii fazia questão de lhe recordar, mas tinha idade suficiente para saber exatamente quem era aquele homem, que iniciava uma conversa com outro russo do outro lado do átrio do hotel de luxo. Era vigoroso, perigoso… Especialmente para uma mulher como ela. Ele vivia além das convenções e das regras.

A sua pulsação acelerava enquanto o observava secreta e apaixonadamente. Era alto, tão alto como Vasilii, que media um metro e noventa, comparado com ela, que media um metro e setenta e cinco. Também era um pouco mais novo do que o irmão, suspeitou. Talvez tivesse quase trinta anos, considerando que Vasilii tinha trinta e cinco anos. O cabelo espesso era castanho-claro, recordando-lhe a cor de um dos casacos de caça do seu irmão, apesar de o cabelo daquele homem precisar de um corte.

Em todo o rosto dele, na estrutura óssea, nos contornos, na expressão, havia traços subtis de uma herança, que dizia que aquele homem provinha de uma longa linhagem nascida para travar batalhas contra outros membros do seu próprio sexo e pôr-se de pé sobre os seus corpos quando os derrotasse. Era um puro macho-alfa e um homem determinado a desafiar qualquer um que questionasse os seus direitos a essa herança.

O nome dele era Kiryl Androvonov. Ela saboreou o nome dentro da sua mente, desenrolando-o como uma magnífica carpete de prazer. Sentira-se tão adulta, forte e com o controlo do seu próprio destino quando perguntara ao porteiro, casualmente, se sabia quem era o homem, fingindo que o reconhecera como algum conhecido do seu irmão… O nome Kiryl significava «nobre», mas o porteiro apenas lhe contara que era um homem de negócios e que aquela era a sua segunda estadia no hotel.

 

 

Kiryl não pretendia procurá-la… A jovem mulher esguia de cabelo loiro-escuro comprido e olhos verdes que lhe recordavam a luz do sol no rio Neva congelado no inverno ou a lenda russa de Rusilki, que contava a história de feiticeiras letais que saíam das suas sepulturas no oceano para atrair os homens. Em primeiro lugar, não era o seu tipo e, em segundo, tinha coisas muito mais importantes em mente do que aceitar o convite implícito que ela lhe oferecia.

Mas tinha olhado e lá estava ela, na mesma cadeira, na mesma mesa, a servir-se de chá do samovar fumegante que o hotel oferecia aos hóspedes russos.

Não usava aliança… Não que isso significasse alguma coisa hoje em dia. Seria, então, uma prostituta de luxo à procura de clientes? Talvez, mas duvidava. Se fosse, já se teria aproximado… Afinal, tempo é dinheiro em qualquer negócio.

De qualquer forma, ela desejava-o. Sabia-o. Mas ele não a queria. E nem pretendia permitir-se querer, embora aquela blusa astronomicamente cara de seda que vestia lhe delineasse os seios inegavelmente naturais e altamente desejáveis. A blusa, que a cobria do pescoço à cintura, não deveria ser sexy. Aqueles botões de pérola impossivelmente pequenos para os dedos de um homem, que fechavam todo o caminho até ao pescoço, não deveriam deixá-lo desejoso de os abrir e expor-lhe a pele ao seu toque e ao seu olhar, mas deixavam. Os brincos de diamantes que usava… Se fossem verdadeiros, e suspeitava que eram, teriam custado milhares de libras a quem lhos dera. Sabia-o porque a sua última amante tentara persuadi-lo a comprar-lhe um par parecido, um pouco antes de ter decidido que ela já não lhe interessava.

Enquanto os avaliava, e era apenas o que estava a fazer, ela levantou os olhos diretamente para ele, a cor hesitando-lhe no rosto, as pestanas escuras fechando-se sobre os olhos verdes, flamejantes como o mercúrio aquecido… ou o desejo de uma mulher muito excitada. Inesperadamente, o seu próprio corpo respondeu como a mudança do inverno gelado de São Petersburgo para o verão feroz da estepe russa, com toda a paixão que a terra do seu pai sempre lhe inspirara, tão ferozmente como se guardasse em si a essência do significado que todo aquele património tinha para Kiryl. Sentia a explosão do seu desejo de tomar e possuir aquele património, de o reivindicar e de se recusar a cedê-lo a qualquer um.

Apanhado desprevenido pela explosão de excitação masculina, reconheceu que aquela mulher, fosse quem fosse, estava a desviar-lhe a atenção de algo muito mais importante do que algum tipo de fantasia juvenil de possuir uma mulher que, de alguma forma, seria um elo mágico entre ele e a sua herança russa.

– E, como já disse, Vasilii Demidov será o seu maior obstáculo para conseguir o contrato.

Kiryl concentrou a atenção no agente que contratara para o ajudar a conseguir o contrato que estava determinado a obter para os seus negócios. O facto de um dos homens mais ricos da Rússia ser também um concorrente não o abalara. Longe disso. Apenas aumentara o seu desejo de ganhar.

– Demidov nunca demonstrou nenhum interesse prévio pela indústria naval ou de transporte. Os seus interesses comerciais encontram-se, na sua maioria, em possuir e controlar os negócios à distância – comentou Kiryl. – Por isso, não tem motivo para ter qualquer interesse no contrato.

– Não tinha, mas está atualmente na China a concluir outro contrato e, como parte do acordo, os chineses querem uma participação maioritária numa linha de transporte de contentores. Ele está numa posição que pode minar qualquer preço que você venha a oferecer, mesmo que signifique adquirir o contrato com uma perda inicial. O processo de seleção está entre vocês os dois, mas com tudo a favor dele. Receio que, com Demidov como concorrente, não conseguirá ganhar.

Kiryl lançou um olhar severo ao seu agente.

– Recuso-me a aceitar isso.

Não podia e não perderia aquele contrato. Era o último bloco da construção, a última peça do jogo de xadrez da sua vida profissional, que estabeleceria a supremacia na sua área… Não apenas aos seus olhos, mas aos olhos de toda a Rússia. Ninguém o impediria de atingir aquele objetivo. Ninguém. Trabalhara demasiado para deixar que isso acontecesse.

A imagem formou-se na sua mente: o perfil de um homem, os olhos duros e implacáveis, rejeitando a criança que ele tinha sido. O seu pai. O pai que lhe negara não apenas o direito ao nome, mas também o direito ao seu sangue russo. Exatamente o que Vasilii Demidov faria se lhe negasse o direito de cumprir o seu objetivo.

– Então, deve esperar por um milagre… Porque é disso que vai precisar para o ultrapassar e conseguir esse contrato.

Kiryl não permitiu que a sua voz transparecesse o que sentia, dizendo simplesmente, com um tom de voz tão implacável como o inverno:

– Deve haver alguma coisa que o faça desistir… Alguma forma de o minar. Um homem não faz o dinheiro que ele fez sem ter guardado um segredo do seu passado que não gostaria de expor.

O agente inclinou a cabeça grisalha perante a declaração de Kiryl antes de o alertar.

– Não é o primeiro homem à procura de algum ponto fraco de Demidov que possa ser exposto, mas não há. É à prova de tudo. Não é vulnerável, não há nenhum pecado do passado a assombrá-lo e nada no presente que possa ser usado contra ele. É inexpugnável.

– É impressionante, concordo. Mas nenhum homem é inexpugnável. Deve haver algum modo, uma vulnerabilidade… E garanto-lhe uma coisa: vou encontrá-la, usá-la e explorá-la.

O agente permaneceu em silêncio. Sabia que não devia argumentar com o homem que estava diante de si. Kiryl construíra a sua riqueza e posição de autoridade e poder através dos meios mais difíceis e desafiadores.

Todavia, sentiu-se obrigado a recordar-lhe:

– Como já lhe disse, precisa de um milagre para ganhar a Demidov. Siga o meu conselho e desista agora… Deixe que ele consiga o contrato. Dessa forma, pelo menos poupará uma humilhação pública ao ser derrotado.

Desistir? Quando estava tão perto de cumprir o juramento que fizera tantos anos antes? Nunca!

 

 

Conseguiria pegar na sua chávena de chá sem que as mãos lhe tremessem tanto que se arriscava a entornar o líquido quente? Alena não tinha a certeza. O seu coração ainda estava aos saltos dentro do peito e o rosto ainda lhe ardia pelo efeito que aquele olhar penetrante lhe causara. Olhara diretamente para ela. Apoiou as mãos nas faces ainda quentes numa tentativa de as arrefecer. Não devia olhar novamente para ele. Simplesmente, não tinha forças para suportar a virilidade daquele olhar. Derretera-a, transformando tudo num suave líquido de desejo que ainda se agitava dentro dela. Mas, ainda assim, tinha de olhar… Deixar as suas sensações e o seu corpo inebriarem-se do entusiasmo perigoso de toda aquela ferocidade masculina.

O seu pulso acelerara e sentia a garganta tão seca que precisou de fazer um esforço para engolir enquanto permitia que a sua cabeça se virasse novamente na direção dele, o desejo e a excitação eram ainda mais fortes dentro dela pela expetativa… Tudo para se dececionar quando se apercebeu de que ele já não estava lá. Tinha-se ido embora e, graças à sua estupidez tola e imatura, perdera a oportunidade de… De quê? De prolongar a intensidade daquele olhar hipnotizante até que os seus ossos se derretessem e o coração lhe explodisse pela emoção insuportável daquilo? Ele poderia ter-se aproximado, poderia ter-se apresentado. Poderia…

Havia algo no chão… Uma caneta dourada. Devia ser dele. Devia tê-la deixado cair. Rapidamente, Alena levantou-se e foi apanhá-la. Pareceu-lhe fria e dura contra a ponta dos dedos. Viu-o parado perto da porta do hotel. O homem que estava com ele estava a ir-se embora. Segui-lo-ia? Sem se permitir pensar no que fazia, Alena atravessou o átrio do hotel.

O eco dos saltos alertou Kiryl da sua presença. Enquanto caminhava, Alena balançava-se tão delicadamente como as bétulas das florestas do norte da Rússia.

– Deixou cair isto.

A voz dela era tão suave como o suspiro da brisa primaveril, arrefecendo o ar quente e abafado do hotel enquanto lhe roçava a pele.

Estendia a caneta na direção dele. Não era sua, mas, mesmo assim, agarrou-a. A mão dela era delicada, os dedos, compridos e finos, as unhas, com um brilho natural. Tinha um aspeto que o dinheiro não podia comprar: uma beleza natural, translúcida, aliada ao tipo discreto de aparência, que sussurrava pedindo privilégio e proteção. Aquela mulher fora mimada desde a nascença.

Irritado consigo mesmo por ser tão consciente dela, puniu-a por isso ao dizer com tom zombador:

– É claro que ia agarrar a excelente oportunidade de ma devolver, não é? Dado o seu interesse em mim. Nunca ninguém lhe disse que perseguir a conquista e revelar o desejo é papel do homem, não da mulher?

Uma sensação quente percorreu a pele de Alena como se fossem chamas. Merecia aquela zombaria… e aquela crueldade, Vasilii dir-lhe-ia isso. Mas não estava preparada para aquilo e sentiu-se ofendida. Na sua cabeça, de forma tola, construíra uma imagem em que o aspeto perigoso dele era amainado pelo desejo por ela, que se igualava ao que ela sentia por ele. Agora, estava a pagar por aquela fantasia.

Kiryl observou-a enquanto ela tentava superar a humilhação, o orgulho travando uma batalha contra a dor, enquanto os seus dentes brancos mordiam o lábio inferior com tanta força que estava a inchar. Do mesmo modo que incharia com a força do beijo de um homem? Contrariado, sentiu mais uma vez uma pontada no sexo.

– Peço desculpa. Foi desagradável da minha parte.

O seu pedido de desculpas foi deliberadamente falso. Não tinha tempo, nem vontade de lidar com o ego frágil de uma mulher emotiva… Não importava o quanto fosse atraente. Conhecia-se muito bem e sabia que, com o humor que estava naquele momento graças a Vasilii Demidov, a escuridão que existia no seu interior e que nunca conseguira controlar seria libertada e procuraria uma vítima. Com o passar dos anos, Kiryl habituara-se a pensar naquela escuridão como um vampiro mental, um eco de si mesmo que, quando estimulado, podia alimentar-se da dor emocional dos outros. Sem dúvida, haveria quem dissesse que aquela escuridão vinha da sua infância, mas não tinha nenhuma intenção de recordar um período em que estivera vulnerável. Em vez disso, preferia viver o presente e viver o presente significava conseguir aquele contrato. Aquela mulher era apenas uma peça a mais no jogo e, como tal, não tinha nenhuma utilidade, senão um escape momentâneo da frustração reprimida em relação à oferta e à competição em que participava.

A crueldade dele foi insuportável para Alena. Afastou-se dele, sentindo-se demasiado magoada e humilhada para se defender, simplesmente abanando a cabeça e virando-se para voltar para a sua mesa.

Uma vez lá, pediu a conta e pegou no casaco e na mala. Tinha-se exposto demasiado. Merecia a punição que sofrera, pensou. Ainda bem que o seu meio-irmão não estava ali para o ver. As lágrimas desfocavam-lhe a visão.

Kiryl observou os movimentos urgentes e descoordenados dela. Porque queria distanciar-se, só por isso. Mas, ainda assim, o seu olhar e os seus sentidos estavam de alguma forma relutantes em deixá-la partir. Mesmo naquele momento, quando estava claramente chateada, ainda existia uma certa graciosidade nela, uma sensualidade natural e de cortar o fôlego, uma suavidade flexível… do cabelo loiro até aos tornozelos delicados, que eram tão finos que suspeitou que as suas mãos conseguissem fechar-se à volta deles… o que significava que daria tudo ao homem que a possuísse.

E queria ser esse homem? Não era tanto uma questão de querer, tratava-se mais de uma questão de tirar proveito do que lhe era oferecido tão descaradamente. Deixou de lado a sua crítica interior. Era, apesar de tudo, um homem… e com as necessidades de um homem. E era isso o que ela obviamente queria. Praticamente, implorara por isso e seria uma forma de ele se livrar da raiva que sentia por ter os seus planos ameaçados por Vasilii Demidov. Em vez disso, zombara dela. Mas poderia remediá-lo facilmente. Sabia como. Inicialmente, ela iria fingir que o recusava. Então, elogiá-la-ia e ela acabaria por ceder. Era um jogo tão antigo como a própria vida e uma hora na cama com ela na sua suíte seria certamente suficiente para o satisfazer.

Com um ligeiro movimento da mão, chamou a empregada. Após dar instruções, dirigiu-se para a mesa.

Alena estava quase de saída, de costas para ele enquanto esperava que outra empregada lhe levasse a conta.

– Não bebeu o seu chá e, já que estou a precisar muito de uma chávena, que tal dividirmos um samovar? Dois russos juntos, a partilhar uma tradição da nossa terra natal?

O som inesperado da voz dele fez Alena dar meia-volta. O choque intensificou-se quando ele estendeu uma mão e fechou os dedos compridos à volta da mão dela, com o polegar sobre a pulsação instável e acelerada.

O sorriso dele era extremamente charmoso. Amenizou a arrogância das suas feições e transformou-o na fantasia de mau rapaz de qualquer mulher. Deu-lhe a sensualidade de um cossaco, o romantismo de um cigano, a diabrura selvagem de um pirata e o fascínio de um herói. Com aquele sorriso, era tudo aquilo e ainda mais. E seria uma tola se cedesse àquele encanto.

– Não, obrigada.

Tentou soar distante e fria, mas sabia que ele ouvira a rouquidão vulnerável da sua voz, sinal da dúvida e do desejo que questionavam a sua força de vontade. A garganta parecia-lhe seca e arranhada pela tensão. Queria soltar-se da mão de Kiryl, mas, por algum motivo, não conseguia.

Ele sorria-lhe novamente, de forma mais íntima daquela vez.

– Fui rude e ofendi-a, e, agora, está zangada comigo. Acha, sem qualquer tipo de dúvida, que não mereço a sua companhia. E tem razão. Uma mulher tão bonita como você consegue encontrar facilmente alguém mais agradável. Mas acho que tem um bom coração e que esse coração vai sussurrar-lhe que tenha pena de mim.

Ah, sim, podia ser muito charmoso… E muito cruel. E Alena não precisava que Vasilii lhe dissesse como aquilo o tornava perigoso. Todas as mulheres carregam no seu ADN o instinto de saber como um homem pode ser perigoso. E como pode ser irresistível.

O sorriso que acompanhava o pedido de desculpas dele revelava-lhe os dentes fortes e enrugava-lhe a pele à volta dos olhos. O efeito causado por isso parou-lhe a respiração e iniciou um tumulto de pequenos movimentos de excitação no seu estômago. Contudo, a ofensa que ele lhe tinha causado deixara as suas marcas, como uma contusão numa pele pálida, e o seu cérebro advertiu-lhe que tivesse cuidado.

Ele massajava-lhe a pele, acariciando a zona onde a pulsação era tempestuosa, mas o contacto estava longe de a acalmar. Devia escapar dele enquanto ainda podia. Era perigoso e não estava preparada para lidar com aquele perigo.

– Tenho de me ir embora. Eu…

O inglês dela era refinado e sem sotaque. Tirando o samovar que vira na mesa, não parecia russa, exceto pelos olhos verdes que lhe recordavam tão intensamente o rio Neva e a sua cidade natal. E a dor que conhecera lá…

– Pedi chá para nós. Veja… A empregada está a trazê-lo.

Duas empregadas aproximavam-se da mesa, uma levava chá quente e a outra, a conta. A que tinha a conta sorriu-lhe e disse educadamente:

– Desculpe, menina Demidova. Pensei que queria ir-se embora.

Era russa. Tinha de ser com aquele sobrenome. E não era um sobrenome qualquer. Era uma ironia que partilhasse o sobrenome do seu rival… Apesar de ser um nome relativamente comum na Rússia. Talvez fosse um presságio. A mãe adotiva, ou a babushka, que o criara com outras crianças órfãs após a morte da sua mãe, contava muitas histórias a respeito de antigas superstições e crenças, mas ele não acreditava nisso. Apesar de tudo, era um homem moderno.

– Está hospedada neste hotel? – perguntou, puxando uma cadeira para Alena e guiando-a com firmeza para ela, deixando-a sem outra opção senão a de ficar na mesa.

Era ainda mais magnífico e imponente de perto. Mesmo com o ar rarefeito e aquecido do hotel, conseguia, de alguma forma, ter o cheiro do ar puro das estepes da Rússia. Ah, sim… Era perigoso.

– Sim – respondeu ela. – O meu irmão, Vasilii, tem um apartamento aqui no hotel para quando vem de negócios a Londres.

O seu meio-irmão era algo parecido a um nómada e, embora tivesse apartamentos parecidos por todo o mundo e a sua morada mais permanente fosse em Zurique, não havia nenhum lugar a que realmente pudesse chamar de lar.

Alena não sabia se introduzira o seu irmão na conversa para avisar Kiryl de que não estava desprotegida e sozinha ou para se lembrar de como Vasilii julgaria o seu comportamento quando tomasse conhecimento do que fizera. Achava que estava aos cuidados de uma das auxiliares aposentadas da escola feminina em que Alena andara, a qual ele contratara para a acompanhar enquanto estivesse fora. Pobre senhora Carlisle, que tinha sido levada à pressa para o hospital com uma apendicite e que agora recuperava da operação numa casa de repouso para onde Alena insistira que fosse…

A sua ausência dava-lhe um breve período de inesperada liberdade, mas sentia-se culpada pela forma como ludibriara a senhora Carlisle ao fazê-la pensar que tinha contratado a sua sobrinha para ficar no seu lugar. Não era culpa de Alena que a sobrinha dela tivesse ido para Nova Iorque um dia antes de toda a correria para o hospital.

Deveria ter contado a Vasilii o que acontecera, claro, mas não contara. O seu irmão ainda vivia na ilusão de que a senhora Carlisle estava no apartamento com ela.

O coração de Kiryl estremecera e parara, quase lhe cortando a respiração e fazendo com que se sentisse como à mercê de um carrasco. Certamente, ia além de uma coincidência poderem existir dois Vasilii Demidov e ambos com dinheiro suficiente para manter uma suíte num dos hotéis mais caros de Londres. Talvez existisse afinal alguma verdade nas crenças supersticiosas da sua velha babushka a respeito do destino?

Contudo, não construíra o seu negócio e estatuto como bilionário fazendo suposições que não fossem baseadas em factos reais.

Depois de esperar que a empregada acabasse de servir o chá, perguntou casualmente:

– O seu irmão é Vasilii Demidov? Diretor da Venturanova International?

– Sim – confirmou Alena, franzindo o sobrolho quando perguntou angustiada: – Conhece Vasilii?

Estava preocupada, angustiada, com a possibilidade de ele conhecer o irmão? Como todos os bons caçadores, Kiryl tinha faro para a vulnerabilidade das suas presas.

– Não pessoalmente. Apesar de, naturalmente, conhecer a reputação dele como homem de negócios bem-sucedido. Está em Londres? – sabia que não estava, mas queria saber o quanto a rapariga lhe contaria.

– Não. Está na China. Em negócios.

– Deixando-a a si, a irmã dele, a divertir-se aqui, em Londres, aproveitando a vida noturna da cidade? – sugeriu com outro sorriso.

Alena abanou imediatamente a cabeça.

– Ah, não… O meu irmão nunca permitiria que fizesse isso. Não aprova esse tipo de coisa… Especialmente para mim – admitiu, corando imediatamente. Estava a falar demasiado. Certamente, dizendo e fazendo coisas que Vasilii definitivamente não aprovaria.

– Parece um irmão muito protetor – disse Kiryl. Um irmão demasiado protetor que acreditava em guardar algo, alguém que era muito importante. Precisava de descobrir mais a respeito dela e da relação que tinha com o irmão.

– Sim, é – respondeu Alena. – E, às vezes…

– Acha isso irritante e intimidante? – arriscou ele. – É jovem. É natural que queira ter o mesmo tipo de vida que as outras pessoas. Deve ser solitário para si… ser deixada sozinha neste hotel, enquanto o seu irmão está fora em negócios.

– Vasilii é muito protetor. Não me deixa sozinha. Pelo menos, não normalmente. Porém, desta vez… Desta vez, foi necessário.

Alena sentiu novamente a pontada de culpa que sentia cada vez que pensava em como estava a ludibriar o irmão. Mas, por muito que gostasse da senhora Carlisle, era demasiado velha e antiquada. Era tudo tão diferente quando os seus pais eram vivos… O seu pai era tão energético, tão cheio de vida e a sua mãe, tão carinhosa e compreensiva… Alena sentia muito a falta deles, especialmente da sua mãe.

Passava-se alguma coisa ali. Os sentidos apurados de Kiryl diziam-lho.

Arqueou um sobrolho e brincou:

– Parece mais um carcereiro do que um irmão.

Alena sentiu-se novamente culpada. Estava a ser horrivelmente desleal a Vasilii, mas, ao mesmo tempo, era um alívio poder falar de como se sentia. Algo naquele estranho a fizera abrir-se sobre coisas que nunca confidenciara antes a ninguém. Mesmo assim, o seu amor pelo seu irmão insistiu em que o defendesse do comentário de Kiryl.

– Vasilii é protetor comigo porque me adora e porque… Porque prometeu ao nosso pai quando estava a morrer que tomaria sempre conta de mim – baixou a cabeça. – Às vezes, preocupa-me que, por causa da promessa, Vasilii nunca se tenha casado. Por causa dos negócios e porque se preocupa tanto comigo que nunca teve tempo para conhecer alguém e apaixonar-se.

Apaixonar-se? Em que planeta vivia aquela rapariga se achava que o casamento de um dos homens mais ricos da Rússia envolveria paixão? Não que recriminasse Demidov por isso. Quando chegasse a altura de se casar, a sua esposa seria cuidadosamente escolhida através de um processo lógico, não por uma explosão temporária de desejo. Não que fosse dizê-lo a Alena. Quanto mais ela revelava, mais convencido ficava de que aquela jovem seria possivelmente o calcanhar de Aquiles do seu rival.

Contudo, Kiryl não era alguém que cedesse às emoções. Preparava-se sempre antes de agir, esse era o seu lema, e não agiria de outra forma naquele momento, independentemente de uma voz dentro dele exigir que garantisse sem demora o isco que poderia usar na emboscada contra o rival. A defesa que ela fizera do irmão tinha-lhe aquecido o olhar. Os olhos dela pareciam dois lagos profundos e dentro deles podia ver-lhe os pensamentos, apercebeu-se quando o observou por cima da chávena de chá e depois corou, escondendo rapidamente o olhar com o leque escuro das pestanas.

Fora errado da parte dela falar de Vasilii com Kiryl. Era, apesar de tudo, um estranho e sabia como Vasilii se sentia a respeito de a proteger a ela e à sua própria privacidade.

– Tenho realmente de me ir embora.

Kiryl abanou a cabeça e levantou-se.

– Obrigada pelo chá – disse Alena, enquanto ele chamava a empregada.

– O prazer foi meu… E foi apenas o primeiro de muitos prazeres que espero que partilhemos, Alena Demidova.

Antes que pudesse adivinhar-lhe as intenções, ele agarrou-lhe a mão e levou-a à boca. O calor do fôlego de Kiryl sobre os seus dedos trémulos foi suficiente para lhe causar sensações quentes pelo braço, fazendo-a sentir-se fraca pela consciência da sua vulnerabilidade a ele. Estava a namoriscar com ela e a realizar com a promessa sensual implícita naquelas palavras as fantasias às quais Alena se entregara desde que o vira.

Alena olhou para o relógio. Vasilii! Já devia ter recebido e-mails dele e o seu irmão ficaria preocupado se não lhe respondesse rapidamente.

– São quatro da tarde. Preciso realmente de ir. O meu irmão…

– Ah, como a Cinderela receando que chegue a meia-noite, deve ter pressa em deixar-me… E com nada mais do que um sapato para a localizar. Mas vamos encontrar-nos novamente. Não tenha dúvida disso. E, quando acontecer, tentarei assegurar a promessa que vi nos seus olhos que, quando me olharam, se tornaram mais do que apenas um olhar.

Capítulo 2

 

Na privacidade da suíte, Kiryl telefonou ao seu agente, anunciando assim que o homem atendeu:

– Alena Demidova, irmã de Vasilii Demidov… Quero saber tudo o que seja possível a respeito dela – da janela da suíte, podia ver um jardim particular onde a luz de fevereiro começava a perder a força. Uma jovem passeava com duas crianças com uniformes de um colégio exclusivo, mas Kiryl não tinha nenhum interesse no jardim ou nos seus ocupantes. Toda a sua atenção estava concentrada no plano que se desenrolava na sua mente. – Tudo, Ivan… Desde quem são os amigos dela, como passa o tempo, ao que come ao pequeno-almoço. Quero saber tudo. E, mais importante, quero saber tudo sobre a relação dela com o irmão e a dele com ela. Quero saber o que pensa dela e quais sãos os seus planos. Quero sabê-lo até amanhã de manhã.

Desligando antes que o homem mais velho pudesse dizer alguma coisa, Kiryl começou a andar pela sala de estar da suíte. Podia sentir todo o corpo a vibrar com uma mistura potente de entusiasmo e desafio, e com o conhecimento de que embarcara num jogo do qual sairia vencedor. Alena era a solução para a derrocada do irmão. Tinha a certeza disso. Podia senti-lo nos seus genes ciganos, que tinham sido transmitidos pela sua mãe e odiados pelo seu pai.

Inesperadamente, recordou Alena enquanto bebiam chá juntos, tão frágil como uma flor que um homem podia colher e esmagar com a mão, com as emoções e os desejos claramente visíveis.

Algo tentava ganhar vida dentro dele, algo que tinha as suas raízes no breve tempo que partilhara com a sua mãe antes de ela morrer, a única vez na vida que se sentira realmente amado. Por um instante, hesitou. Mas não podia dar-se ao luxo de ser fraco, não naquele momento. Ou tão fraco como a mãe que o concebera contrariando a vontade do marido. Precisava de ser forte para conseguir tudo o que queria e fora instigado e guiado pela memória do homem que fora o seu pai, que o olhara com desprezo quando o pusera na rua e se fora embora.

E, finalmente, estava ao seu alcance. E, se precisasse de ser sacrificada para que ele conseguisse cumprir a promessa que fizera à sua falecida mãe, então, que assim fosse.

 

 

«A promessa que vi nos seus olhos…»

À luz cinzenta da manhã de Londres, Alena estava deitada na cama do seu quarto extremamente decorado, entre os melhores lençóis que o dinheiro podia comprar, mas sentindo-se tão desconfortável como no conto de fadas A princesa e a ervilha. Conto de fadas… Não era o que era aquilo? O conto de fadas de uma jovem mulher. O conto de fadas de um príncipe que não era apenas bonito, como também sensual e sexy, um príncipe que não oferecia a experiência de uma vida mimada, mas a experiência da sensualidade… O tipo de intensidade emocional que talvez fosse apenas uma fantasia.

Era por isso que estava tão nervosa e receosa? Porque, agora que tinha recebido uma pista de que poderia tornar realidade a sua fantasia, receava talvez descobrir que envolver-se sexualmente com Kiryl poderia destruí-la? Sexo com Kiryl. Intimidade com Kiryl. A intimidade de partilhar beijos e carícias, a pele tremendo de excitação, a sedução das mãos dele, os lábios no seu corpo nu… Tremia só de pensar nisso. Mas não era na vida real que precisava de o tirar dos seus pensamentos e da sua vida? Certamente, seria o que Vasilii gostaria que fizesse.

Alena olhou para o despertador. Tinha uma reunião marcada para aquela manhã na instituição de caridade que a sua mãe fundara. Sabia que Vasilii preferia que chegasse aos vinte e cinco anos para seguir o caminho da sua mãe e assumir completamente o controlo da instituição. Ele achava que mesmo aos vinte e um, idade que teria dentro de apenas quinze meses, ainda era demasiado nova para tal responsabilidade. Porém, estava determinada a mostrar que o seu meio-irmão estava errado. Estudara assiduamente o funcionamento da instituição desde a morte da sua mãe.

Era uma grande responsabilidade… Gigantesca, na verdade. A instituição não geria apenas os milhões que os seus pais tinham doado, mas também verbas doadas por outros patrocinadores para a educação das crianças. Que hipóteses teria de convencer o seu meio-irmão de que estava preparada para arcar com tais responsabilidades se ele soubesse do seu comportamento imprudente com Kiryl? Nenhuma. Consideraria tal comportamento imaturo e irresponsável.

A sua mãe sempre dissera que a caridade era o modo de agradecer pela vida e pela felicidade que lhe tinham sido dadas ao conhecer o marido. Nem mesmo Vasilii, com a sua atitude obstinada em relação ao dinheiro, podia argumentar contra essa motivação. Independentemente de por vezes se opor ao controlo dele da sua vida, sabia muito bem que tinha o poder de lhe derreter o coração simplesmente porque amara e valorizara a sua mãe. Para um homem tão duro e intransigente, era difícil admitir que uma inglesa tinha, através do amor pelo marido e por ele, transformado a vida deles. Embora o admitisse só a ela, era algo que sempre lhe tocaria o coração. O amor e a preocupação que Vasilii lhe dedicava, a proteção, eram a forma de retribuir o amor que ele recebera da sua mãe. Apenas desejava que ele relaxasse um pouco a postura de guarda protetor.

Queria ela realmente arriscar tudo pelo qual tanto trabalhara por apenas uma paixão cega que tinha tanto de real como um arco-íris sobre o Neva?

Não precisava de se perguntar o que Vasilii diria do seu comportamento. Ficaria horrorizado e nervoso. Mas nunca o saberia, pois não? Porque ela seria muito inteligente e responsável, e não se envolveria com Kiryl. Em vez disso, concentrar-se-ia no futuro e provaria ao irmão que era suficientemente madura para assumir as responsabilidades da sua falecida mãe dentro da instituição de caridade.

Duas horas mais tarde, ao sair do táxi diante da instituição da sua mãe, Alena compôs a roupa e respirou fundo. A sua mãe dizia sempre que a aparência contava muito. Negócios podiam ser desfeitos se a impressão transmitida não fosse boa, mesmo antes de se dizer qualquer palavra. Alena lembrara-se desse sábio conselho quando se vestira naquela manhã. Podia ser seu direito por herança assumir o controlo da instituição, mas não poderia fazê-lo com total sucesso sem o apoio dos executivos. Precisava de conquistar o apoio e a confiança deles para ser capaz de continuar com o sucesso da sua mãe. Por essa razão, escolhera vestir algo que mostrasse individualidade e maturidade ao mesmo tempo.

Optara por uns sapatos pretos de salto médio e umas meias opacas em vez de umas botas de cano alto. As botas seriam uma escolha lógica no tempo frio, mas havia botas e botas… E, certamente, não queria ser julgada como alguém que queria chamar a atenção com o modo de se vestir. Para se proteger do vento frio de fevereiro, usava um cachecol cinzento-escuro ao pescoço e um gorro de lã na cabeça. O par de luvas cinzentas sem dedos permitiu, que pagasse ao taxista e o seu sorriso ao porteiro, que lhe abriu a porta de vidro dos escritórios, fez com que ganhasse outro sorriso em resposta.

Inicialmente, quando a mãe fundara a instituição, desejara que a sede ficasse em Londres porque era a sua cidade natal. Mas desejara que fosse num lugar muito mais modesto e barato do que o endereço atual em Mayfair. Tinham sido o seu pai e o seu meio-irmão que a tinham persuadido a aceitar que, se a instituição pretendesse atrair patrocinadores, precisava de se localizar num lugar com mais prestígio. Além de mais seguro.

A segurança era importante para Vasilii. Mas isso não era surpreendente, visto que a mãe dele tinha sido vítima de um sequestro que correra mal e que resultara na sua morte. Fora após esse incidente que o seu pai se mudara para Londres, apesar de ter sido em São Petersburgo, na Rússia, que os seus pais se conheceram. A morte deles num acidente de carro tinha sido um choque e uma perda terríveis, mas, felizmente, ela sempre tivera Vasilii.

Fora errado da sua parte deixar-se levar pelo desejo desconhecido por Kiryl e estava feliz por ter decidido deixar todo aquele incidente para trás e concentrar-se no que realmente importava na sua vida.

A obra de caridade da sua mãe envolvia ajudar meninas que viviam na miséria por todo o mundo. Uma equipa multicultural trabalhava para a instituição e a diretora-geral da América do Sul, Dolores Alvarez, conhecera a pobreza na infância. Agora, estava perto dos cinquenta anos e as linhas do rosto demonstravam toda a sua experiência de vida e compaixão.

Ela deu as boas-vindas a Alena com um sorriso cordial enquanto a conduzia até ao seu escritório e pedia café para as duas.

– Tivemos uma surpresa adorável esta manhã. Deve saber que um dos últimos objetivos da sua mãe era conquistar mais patrocinadores e que estivemos a fazer uma campanha para conseguir isso.

– Sim, sei como os meus pais pensavam que era importante ampliar o alcance da instituição.

– Após a morte dos seus pais, recebemos algumas doações muito generosas dos colegas e amigos deles, mas foram doações únicas. Porém, agora fomos abordados por um potencial patrocinador com uma oferta que parece muito promissora. Antes de se decidir, diz que quer conhecê-la.

– Porque quer saber se sou capaz de dirigir a instituição com sucesso? – lançou um olhar amargo a Dolores e acrescentou: – É exatamente o tipo de coisa que Vasilii faria.

– Os homens ricos gostam de ter total controlo da sua riqueza.

– Controlador obsessivo? – disse Alena, com tristeza.

Dolores sorriu, mas abanou a cabeça.

– Talvez, mas a cavalo dado não se olha o dente ou…

– Podemos assustá-lo? – sugeriu Alena.

– Não. Não se quisermos ter sucesso em cumprir o sonho mais ambicioso da sua mãe. O dinheiro que deixou como garantia à instituição proporciona um bom rendimento, mas…

– Mas precisamos de mais dinheiro. Sim, eu sei. Estive a analisar os nossos relatórios financeiros e o aumento do custo de vida em alguns dos países onde estamos significa que o preço para providenciar estudos aos mais necessitados nesses países também está a aumentar.

Antes de concordar, a diretora-geral lançou-lhe um olhar de aprovação, que Alena suspeitou que também contivesse alguma surpresa.

– É verdade, sim. O que significa que é importante arranjar sempre novos patrocinadores. Pelo que ele me disse, está a considerar fazer uma doação anual generosa, se lhe agradar como…

– Como o quê? – pressionou.

Dolores parecia ligeiramente desconfortável.

– Diga-me – insistiu Alena. – Tenho o direito de saber.

– Sim, claro – Dolores hesitou novamente e, depois, contou-lhe. – Ele demonstrou alguma preocupação quanto ao facto de alguém tão jovem assumir a direção da instituição. Por esse motivo, expressou o desejo de a conhecer pessoalmente.

– Para avaliar a minha capacidade de ficar no lugar da minha mãe?

– Para ter a certeza de que está a tomar a decisão certa – corrigiu-a diplomaticamente.

– Mas claro que, se preferir não se encontrar com ele, podemos inventar alguma desculpa educada… O que acha de dizer que prefere que o seu irmão lide com a situação?